quinta-feira, 10 de junho de 2010

FONTE ESPAÇO VITAL

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Zero Hora condenada a indenizar advogado que teve frase plagiada em concurso

(10.06.10)

O sonho frustrado do leitor e advogado Laerte Bonetti de Andrade (OAB/RS nº 61.879, com atuação especialmente em direito trabalhista bancário, na defesa de instituições financeiras) de ir a São Paulo assistir ao jogo do Internacional de Porto Alegre, desfrutando da promoção “RBS Leva Você à Final da Libertadores”, deverá ser reparado pela forma desleal como o torcedor foi vencido no concurso de frases lançado pelo jornal Zero Hora.

O autor da frase vencedora receberia a viagem-prêmio a ser realizada em 9 de agosto de 2006. Laerte enviou pela Internet a sua criação, esperançoso na vitória, mas no dia 7 de agosto verificou que seu nome não estava inserido entre os ganhadores da promoção. Na ocasião, não foram divulgadas publicamente as frases escolhidas.

Dias depois, porém, Laerte encontrou no saite da Zero Hora a revelação das melhores frases. Ao lê-las, Laerte se surpreendeu ao ver que a 28ª frase selecionada era, literalmente, a sua, embora seu nome não figurasse no rol dos contemplados, e sim o de Michele Michel Ruano.

A ação ajuizada por Laerte contra a RBS Zero Hora Editora Jornalística S.A. e contra a contemplada Michele revelou que o autor da frase havia sofrido plágio por parte da outra concorrente da promoção, em face de falhas de segurança no processo seletivo executado pelo jornal.

Na sentença, o juiz de Direito Maurício da Costa Gamborgi, da 8ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, identificou o ato ilícito a partir de um documento juntado aos autos que dava conta de que no sistema informatizado da Zero Hora aparecia a informação de que Laerte postara a sua frase no dia 5 de agosto de 2006, enquanto a Michele o fizera somente no dia seguinte. Segundo o juiz, "todo um conjunto de fatores relevantes e significativos atua em prol da convicção de que efetivamente ocorreu uma fraude".

Para o magistrado, a fraude teria ocorrido mediante a participação de alguém no âmbito interno da empresa, ou com o concurso de fraude eletrônica (tipo "hacker").

Fato instigante é que a postagem eletrônica da frase pela ré ocorreu no último dia do certame e apenas duas horas antes do encerramento da promoção (às 18 horas), sendo o resultado final divulgado logo às 12 horas do dia seguinte. "Não é crível que num universo de vinte mil frases remetidas a primeira ré fosse deixar todo o trabalho de seleção e escolha para depois do encerramento do prazo de inscrição, prazo a partir de cujo encerramento teria apenas mais cerca de 16 horas para divulgação do resultado da promoção, tudo indicando portanto que o trabalho de seleção e escolha deve ter sido desenvolvido ao longo do prazo de inscrição" - raciocionou o juiz Gamborgi.

A defesa da ré Michele centrou-se na alegação de que teria ocorrido uma situação acidental, na qual duas pessoas enviaram frases idênticas.

O julgador rechaçou essa argumentação, afirmando que "a tese teria dificuldade de ser aceita até pela Velhinha de Taubaté, personagem idealizada no passado pelo humorista Chico Anísio e marcada pela ingenuidade exacerbada e pela capacidade de engolir estórias e versões esfarrapadas".

A sentença de primeiro grau eximiu Zero Hora de responsabilidade pelo ato ilícito, imputado exclusiavamente à ré Michele, e condenou esta a indenizar os danos materiais (valor da viagem, como lucro cessante) e morais sofridos por Laerte (estes arbitrados em R$ 4.500,00).

Inconformados, tanto Laerte como Michele apelaram ao TJRS, onde os recursos foram distribuídos à relatoria do desembargador Jorge Luiz Lopes do Canto, da 5ª Câmara Cível.

O autor pedia a extensão da condenação à Zero Hora e a majoração da condenação pelo dano moral. Já a ré requeria a reforma total da sentença, com improcedência dos pedidos, ou a redução da condenação.

Após rejeitar a preliminar que inquinava de extra petita a sentença, o relator lembrou que o serviço fornecido por Zero Hora submete-se às normas de defesa do consumidor, pois, com a promoção lançada pelo jornal, a empresa obteve remuneração indireta, por meio de anúncios publicitários.

Também para o relator "nem mesmo se mostra crível a argumentação da demandada, de que ela mesma criou a frase e que tudo decorreu de uma coincidência, porquanto da simples leitura do parágrafo se depreende ser improvável, quiçá impossível, que dois participantes tenham criado um texto idêntico."

No tocante à responsabilidade da empresa jornalística, o desembargador ressaltou que esta "poderia e deveria ter adotado mecanismos de segurança para obstar a contemplação de pessoa diversa, que postou a frase depois do verdadeiro criador. Entretanto, optou por agir de forma negligente na seleção das frases merecedoras do prêmio, adotando critérios unicamente subjetivos, dando azo a injustiças, como no caso em tela."

Asseverou o magistrado que a editora jornalística cometeu ato ilícito por negligenciar na escolha das frases, premiando quem apresentou o posteriormente, "sem se importar com a efetiva autoria".

Entendeu o desembargador Jorge do Canto que Laerte perdeu uma chance de ver seu time disputando uma competição esportiva relevante, "marco importante na história colorada, que em função desta conquista, logo após veio a obter mais um título internacional reconhecido pela FIFA, sendo possível imaginar o sofrimento do autor ao não presenciar prélio de tamanha envergadura disputado pelo time alvirrubro de seu coração, que, com o resultado de São Paulo abriu caminho para galgar o título de campeão da América neste século".

Segundo o julgado, "a frustração ultrapassa o mero incômodo para os amantes do futebol, em especial aqueles que chegam ao ponto de criar frase que retrata esta paixão, como é o caso do autor".

Levando em consideração o porte da RBS Zero Hora e o fato de a ré Michele ser farmacêutica, o relator votou pelo aumento do valor da condenação pelo dano moral a R$ 5.100,00 e manteve a quantia indenizatória do prejuízo material, consistente no valor de um pacote de viagem a São Paulo para assistir à partida final da Taça Libertadores.

As rés ainda dividirão o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes de 20% sobre a condenação.

Os desembargadores Gelson Rolim Stocker e Romeu Marques Ribeiro Filho acompanharam o relator. O acórdão foi unânime tendo sido publicado em 8 de junho; não há, portanto, trânsito em julgado até o momento.

Atuam em nome do autor os advogados João Carlos Silva da Rocha, Paulo Kreichtmann Junior, Luiz Augusto de Vasconcellos Rocha, Diego Guimarães Rocha e Jorge Alberto Escobar Rodrigues. (Proc. nº 70034246678).

Em tempo (1)

A frase premiada objeto da controvérsia é:

“Se o coração de todos é vermelho, o meu tem um pouco de branco.
De tudo, já vi um tanto,
Mas amor como esse só existe um,
Que sempre teve um sonho,
Que de azul foi passado
E que de vermelho será pintado,
Com a maestria de um legado chamado colorado.”

Em tempo (2)

Curiosidade do Espaço Vital: como é que se escolhem as "melhores" entre 20 mil frases?

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